São Paulo — A Bolsa brasileira vive, em 2017, um dos seus melhores momentos, graças a uma combinação de fatores como a melhora do humor externo, a queda na taxa básica de juros e os tão aguardados sinais de retomada da economia. Com isso, empresas que há tempos adiavam a estreia na B3 (novo nome da BM&FBovespa), decidiram retomar seus planos.
De janeiro a novembro, foram realizados oito IPOs (ofertas públicas iniciais de ações) —um salto se comparado aos últimos três anos, quando apenas três companhias completaram o processo. No total, as operações somaram 13,7 bilhões de reais.
Mas não é só para as ofertas bilionárias que o mercado está mais receptivo. As empresas de menor porte encontram no momento atual uma brecha para poder acessar a Bolsa. Há quase três meses, a Senior Solution, que desenvolve softwares para o setor financeiro, migrou do Bovespa Mais —o segmento de acesso da B3— para o Novo Mercado.
A mudança foi histórica porque pela primeira vez uma companhia de médio porte conseguiu completar todas as fases de entrada da Bolsa até alcançar o nível mais alto de governança corporativa, que reúne gigantes como Carrefour, Embraer e Fibria.
No Bovespa Mais, segmento criado em 2005, as companhias podem acessar o mercado de maneira gradativa. Embora não haja restrições ao porte das empresas que podem participar, em geral ele é buscado por pequenas e médias.
Um dos principais diferenciais do Bovespa Mais é permitir que as companhias se listem na Bolsa sem realizar, de forma imediata, a oferta de ações. É oferecido um prazo de até sete anos às empresas para realizar o IPO. Com isso, elas conseguem visibilidade com investidores, enquanto adequam suas estruturas às exigências de governança corporativa.
Além da questão do tempo, as companhias também recebem benefícios financeiros. Elas são isentas do pagamento da taxa de análise para listagem de emissores, (que atualmente está na casa dos 60 mil reais), e recebem desconto progressivo na anuidade (35 mil reais, acrescido de uma taxa de 0,005% do capital social), começando por 100% no primeiro ano.
A Bolsa também custeia a produção de relatórios de análises após o IPO. Duas instituições especializadas acompanham a empresa, sendo que cada uma delas produz dois relatórios de análise por ano, que posteriormente são disponibilizados ao público.
Atualmente, 15 companhias estão listadas no segmento de acesso. Dessas, 13 estão no Bovespa Mais e duas no Bovespa Mais Nível 2, cuja grande diferença em relação ao segmento tradicional é permitir a emissão de ações preferenciais, sem direito a voto.
Das participantes, apenas uma, a produtora de fertilizantes Nutriplant, têm ações negociadas. A companhia —que inaugurou o Bovespa Mais em 2008 com um IPO na casa dos 21 milhões de reais— era acompanhada pela Senior Solution, que fez parte da lista de 2013 até este ano, quando migrou para o Novo Mercado.
Tendo em vista o prazo dado pela Bolsa e o período em que as as companhias foram listadas no segmento, em breve essa lista ganhará reforços. Nos próximos cinco anos, cerca de dez empresas devem alcançar o objetivo final do programa, com o toque da campainha que marca o início da negociação no pregão.
Empurrãozinho do BNDEs
As companhias listadas no Bovespa Mais não compartilham muitas semelhanças, além, claro, do fato de serem emergentes. Suas áreas de atuação variam de tecnologia da informação ao varejo de materiais de construção, passando pelo ramo alimentício e a fabricação de insumos farmacêuticos.
Uma característica, no entanto, une 11 das 15 atuais participantes do segmento: todas elas têm ou tiveram como sócio o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A explicação para isso é uma regra do banco público, que exige que empresas de capital fechado que sejam aportadas entrem no mercado de capitais. No caso das grandes, o investimento é condicionado à listagem no Novo Mercado. Quando a empresa tem porte menor, a indicação é para o Bovespa Mais.
O prazo para o ingresso na Bolsa varia caso a caso e depende do grau de maturidade da companhia. “Quando aportamos recursos, o plano de negócio da empresa é analisado e são traçados alguns objetivos que devem ser cumpridos até ela pode entrar no mercado”, explica Eliane Lustosa, diretora de Mercado de Capitais do BNDES. “Na média, as companhias conseguem entrar em algum dos segmentos em até três anos”.
“No final do prazo, o banco avalia se o mercado está receptivo a novas colocações. Eventualmente, o prazo pode ser estendido, caso a instituição compreenda que aquele não é um bom momento”, diz.
O interesse do banco em fomentar a entrada das empresas na Bolsa tem como pano de fundo, além do próprio incentivo ao mercado de capitais, o ganho de liquidez. “Isso beneficia o próprio BNDES, que ganha com a valorização da empresa e com o avanço do mercado de capitais, mas também com a possibilidade de sair do investimento, quando julgar necessário”, diz Lustosa.
A expectativa do BNDES é que, até o final de 2018, três novas companhias entrem no Bovespa Mais. Uma é do segmento de equipamentos médicos, outra de equipamentos elétricos e a última de tecnologia da informação.
Atualmente, 29 pequenas e médias empresas estão na carteira do banco público, com o recebimento de investimentos diretos. De forma indireta, através de fundos, são cerca de 100.
Além do condicionamento do apoio financeiro à entrada na Bolsa, o BNDES também mantém um programa específico de incentivo ao Bovespa Mais. O projeto, lançado em 2014, prevê investimentos de até 1 bilhão de reais em ofertas públicas no mercado de acesso. A atuação do BNDES, nesse caso, seria como investidor-âncora, garantindo a subscrição em até 20% da oferta.
O problema, diz Lustosa, é que nenhuma empresa se interessou pelo programa até o momento. O motivo da falta de demanda, segundo ela, ainda é discutido.
“Atualmente, estudamos uma reformulação desse programa. Discutimos as regras para descobrir porque ainda não deu certo”, diz a executiva. “A questão do cenário econômico certamente influenciou. Nos últimos anos, o mercado andou de lado. Agora que ele está vivendo um momento de revigoração, as empresas emergentes devem procurar por oportunidades”.